A deficiência do atendimento e o sucateamento da rede pública de saúde é uma dura realidade que os pacientes do DF enfrentam. Érika Kokay, Deputada Federal pelo PT, presidiu em 2007, ocasião em que era Deputada Distrital, a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa, Comissão que detectou e denunciou uma série de irregularidades nas unidades de saúde da Secretaria de Estado e Saúde do Distrito Federal.
KLEBER: Como Deputada Distrital, a senhora presidiu a Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa. Qual foi a realidade encontrada nos Hospitais do DF?
ÉRIKA KOKAY: Nos hospitais do DF houve um abandono muito grande nos últimos 12 anos e uma entrega de bandeja da saúde pública para a iniciativa privada. O parque tecnológico foi todo destruído e a deficiência de pessoal era gritante. O governo Agnelo está revertendo isso, pois tem chamado muitos concursados. Mas tinha uma deficiência pessoal, um parque tecnológico ultrapassado, sem manutenção, ausência de medicamentos e toda sorte de negócios suspeitos dentro da saúde. A saúde virou um negócio. E o povo não era considerado.
KLEBER: Por que a investigação da Saúde do DF ficou sob a competência da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos, Cidadania, Ética e Decoro Parlamentar, e não da Comissão de Educação e Saúde?
ÉRIKA KOKAY: Porque a Saúde é um direito básico da população. Ela é fundamental e está assegurada na nossa Constituição. A nossa condição humana já nos assegura o direito a saúde pois dela depende outros direitos. Se você não tem saúde, não pode exercer a plenitude dos direitos humanos.
KLEBER: Falta de recursos, aumento de demanda de pacientes, terceirização, problema de gestão, afinal por que a saúde pública no DF não funciona como deveria?
ÉRIKA KOKAY: O que se viu nos últimos 12 anos, foi uma destruição da saúde de forma muito intensa. Brasília com o maior orçamento per capita de saúde do Brasil é o último lugar em cobertura de saúde da família. Tivemos na distribuição da atenção primária, que deveria ser atendida pelos centros de saúde, uma lógica muito hospitalocêntrica, asfixiando os hospitais. Ou seja, a demanda que seria da atenção primária foi absorvida pelos hospitais. Ela ficava reprimida dentro das unidades hospitalares. Então, foi um caos o que vimos nesses últimos 12 anos. Denunciamos isso, encarando como um direito humano e trabalhamos muito, porque no último período do governo Arruda, tivemos uma nítida intenção do governo privatizar e terceirizar colocando o SUS no DF em risco. Acho que não corre mais. Mas é preciso, que lembremos dessa experiência, para que possamos desconstruir todas as tentativas de terceirizar pontualmente a saúde do DF. Não vamos permitir a terceirização de diagnóstico por imagem, de laboratórios, de farmácias e das lavanderias que têm sido tão faladas. Elas são inadmissíveis. Já vivemos uma experiência de terceirização nefasta para a população do DF, a do Hospital de Santa Maria. E hoje, com a retomada da gestão pelo Estado, vimos em todos os índices, que a experiência de Santa Maria não corresponde ao povo do Distrito Federal.
KLEBER: Quais as consequências do sucateamento da saúde, como foi chamado, trouxe para os usuários da saúde?
ÉRIKA KOKAY: O usuário da saúde está sentindo na pele. É um sofrimento muito grande. Eles vão às unidades hospitalares porque não têm atenção primária e muitas vezes, a demanda é de atenção primária. Há determinadas especialidades, que demoram em média, por levantamento do Ministério Público de Contas, mais de um ano para que eles tenham direito a consulta. O Estado paga muito caro por UTI, porque falta leitos públicos, situaçao que está mudando hoje. Chegamos a pagar R$ 3 mil, por plano privado enquanto o plano de saúde pagava R$ 1.800, por um mesmo leito. Portanto, nisso tudo quem sofre é o usuário. A pessoa é o fim de qualquer política. Quando a gente pensa em qualquer política pública em qualquer atuação do estado em qualquer esfera seja no Ministério Público, seja no Judiciário, no Executivo ou no Legislativo a pessoa é o fim. A pessoa não é um objeto. Os objetos, os instrumentos são os meios de se atingir a pessoa, e assegurar a ela a sua vida plenamente humana. O usuário é o que mais sofre e que mais tem sofrido.
KLEBER: A senhora, nessas visitas realizadas nos hospitais, constatou que o sucateamento, também se abateu sobre os servidores da saúde. Como a senhora vê esse quadro?
ÉRIKA KOKAY: Foi um desprezo muito grande com os servidores. Acho que não se reconstrói a saúde, sem fazer um pacto democrático com os servidores. Culpar os servidores, como vimos no governo anterior, na época do Geraldo Maciel, como se todos os problemas da saúde fossem culpa deles, quando não é. São profissionais altamente qualificados e têm uma vida dedicada a saúde. Foram considerados como coisas e menosprezados, até porque havia uma lógica, de destruir a saúde, para justificar a terceirização. A mesma lógica que aconteceu na Companhia Siderúrgica Nacional(CSN), e nas elétricas privatizadas durante o governo Fernando Henrique Cardoso, onde se destrói o serviço público deliberadamente, para justificar a privatização. Os servidores são os grandes privatizados. São heróis e heroínas porque com tudo isso, conseguiram manter o nível de atendimento, não o que seria necessário para a população, porque saúde não se faz só com atendimento. A diferença no peso do servidor na saúde em relação a educação por exemplo, é que na educação é óbvio, que se você estiver bem equipado, bem instrumentalizado, você tem uma educação de melhor qualidade. Na saúde por sua vez, por melhor que seja o profissional, se ele não tem medicamente, insumo e equipamentos para diagnósticos, ele fica com muita dificuldade de atuação. A relação entre profissional e aluno é muito mais determinante na educação que na saúde. Mesmo com tudo isso, os servidores da saúde fazem o inimaginável para atender a população.
KLEBER: Quais são os encaminhamentos dados nos trabalhos da Comissão de Direitos Humanos?
ÉRIKA KOKAY: Nós fizemos uma grande parceria. Fizemos uma rede em defesa da saúde, uma rede dos SUS aqui no DF, onde levamos essa discussão para o Conselho Nacional de Saúde, para o Ministro da Saúde, para o Tribunal de Contas da União, o Tribunal de Contas do DF e a Controladoria Geral da União(CGU). A terceirização do Hospital de Santa Maria por exemplo, foi criminosa, levamos para o Ministério Público. Enfim, fizemos toda sorte de denúncias, com todos os órgãos de controle. Buscamos organizar e empoderar os servidores e os Conselhos, para que pudéssemos fazer frente a tudo isso.
KLEBER: Como Deputada Federal a saúde continua sendo uma prioridade?
ÉRIKA KOKAY: Faço parte da Comissão de Direitos Humanos e sou suplente da Comissão de Seguridade Social na Câmara Federal, então a saúde continua sendo uma das prioridades fundamentais, porque ela é um direito básico e tem um orçamento extremamente vultoso. Temos uma relação de transferência de recursos da União para o DF, que é muito significativa. E isso faz com que exijamos uma saúde pública de qualidade.
Érika Kokay, ex-Deputada Distrital, presidiu a
Comissão de Direitos Humanos da Câmara Legislativa do Distrito Federal;
Deputada Federal, titular da Comissão de Direitos Humanos e Minorias e,
suplente da Comissão de Direitos Humannos da Câmara Federal.